segunda-feira, 16 de maio de 2011

A clínica do horror: Roger Abdelmassih concebeu filhos que não eram dos pais biológicos

Em 23 de novembro de 2010, a Justiça brasileira deu seu veredicto: a clínica de reprodução assistida do médico Roger Abdelmassih fora palco de um show de horror. A acusação de ter estuprado sistematicamente dezenas de pacientes levou o mais renomado especialista em reprodução humana do Brasil ao banco dos réus em 2008. A condenação de Abdelmassih a 278 anos de prisão pelos abusos, no entanto, não encerrou um dos mais dramáticos capítulos da história médica do país. Nos últimos dois anos, o Ministério Público do Estado de São Paulo e a Polícia Civil investigaram, em sigilo, os procedimentos médicos da clínica e recolheram depoimentos de ex-pacientes de Abdelmassih. Somem-se aos dois inquéritos as revelações feitas a ÉPOCA pelo ex-colaborador do médico, o engenheiro químico Paulo Henrique Ferraz Bastos (leia a entrevista), e chega-se a uma conclusão estarrecedora: parte dos cerca de 8 mil bebês gerados na clínica de Abdelmassih não são filhos biológicos de quem imaginam ser.
Condenado a 278 anos, Abdelmassih está foragido desde janeiro
Essa conclusão é resultado de exames de DNA feitos em pacientes da clínica e em seus filhos. As autoridades estão convencidas de que Abdelmassih enganava seus clientes e implantava no útero da futura mãe, sem o conhecimento do casal, embriões formados a partir de óvulos e espermatozoides de outras pessoas. Os pais biológicos das crianças são outros, e não o casal que se sentou nas poltronas do consultório de Abdelmassih disposto a se submeter ao tratamento de reprodução e que pagou os milhares de reais que o médico cobrava pela fertilização. Pelo menos três casais, um de São Paulo, outro do Rio de Janeiro e o terceiro do Espírito Santo, já descobriram, depois do nascimento da criança, que o DNA de um dos dois não é compatível com o do filho. Esses três casais contaram sua história, comprovada por exames laboratoriais, em depoimento ao Ministério Público. ÉPOCA teve acesso ao processo e revela o conteúdo do depoimento de um desses casais, cuja identidade não será revelada.

A história contada por eles ao MP é chocante. Em 1993, procuraram a clínica de Roger Abdelmassih diante da suspeita de infertilidade do marido. Realizaram exames que, de acordo com Abdelmassih, atestaram a capacidade do casal de gerar um filho. Ainda assim, o médico sugeriu que eles se submetessem a uma fertilização in vitro, que seria, em suas palavras, um procedimento mais rápido e eficaz para obter a tão desejada gravidez. Abdelmassih garantiu ao casal que o filho seria fruto de seus óvulos e espermatozoides e que a fertilização seria usada apenas por uma questão de conveniência. A mulher se entusiasmou com a promessa de gravidez e o marido acabou por concordar em fazer a reprodução assistida. Formados nos laboratórios de Abdelmassih, os embriões foram implantados na mulher.

No marido, porém, cresceu uma dúvida. Durante uma das consultas de sua mulher, já grávida, ele disse a Abdelmassih que faria um teste de DNA depois do nascimento do filho. De acordo com o depoimento dessa testemunha, “alterado e aos gritos, o doutor Roger o expulsou de seu consultório”. Na consulta seguinte, de acordo com o depoimento da mulher, “o médico lhe entregou um envelope com dois comprimidos, um para ingestão imediata e outro após três horas”. A mulher, no entanto, nem chegou a tomar o segundo comprimido. Precisou ser socorrida às pressas com fortes dores abdominais que indicavam o início de um aborto. Análises em laboratório comprovaram que o comprimido dado por Abdelmassih e que a mulher ingeriu era Citotec. É um medicamento usado no tratamento de úlcera e cuja comercialização foi proibida no Brasil, em 1998, por seus conhecidos efeitos abortivos

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