terça-feira, 17 de julho de 2012

O perigo da Teologia sem a Ortopraxia

Toda reflexão bíblica ou teológica sempre precisou ser transportada do campo da reflexão para a prática funcional da vida cristã. O maior desafio da teologia cristã nunca esteve atrelado aos enfrentamentos apologéticos com relação às doutrinas heterodoxas, mas em aplicar na vida prática do discípulo de Cristo os ensinamentos bíblicos. De modo que, enquanto a ortodoxia – “orthos” (reto) e “dóxa” (opinião) é a crença correta, a ortopraxia -“órthos” (reto) e “praxe” (pratica) é a prática correta da crença. Enquanto que, a ortodoxia mantém a consciência universal da obra de Deus na historia e na encarnação de Cristo, a heterodoxia (opinião diferente) é caracterizada pelas associações com as opiniões e doutrinas que discordem de uma opinião oficial ou ortodoxa. Em tempos como o nosso, onde o avanço da relativização teológica é bastante comum, é vital para a igreja manter os fundamentos bíblicos da fé cristã. É também importante destacar que, na historia do cristianismo a doutrina ortodoxa contou com os apologistas, que defenderam a fé cristã enfrentando as heresias que surgiam do lado externo (extra muro), enquanto que, os polemistas defendiam a doutrina bíblica do lado de dentro (intra muro), no próprio contexto eclesiológico. Sendo assim, a vida cristã de certo modo não subsiste apenas do entendimento sistemático da doutrina bíblica, mas principalmente na aplicação dos ensinamentos nas contingencias reais e práticas da vida cristã em comunidade e sociedade. A verdade que se crê e estuda, também deve ser vivida e praticada. Sendo assim, em síntese, a vida cristã não se resume em códigos de uma cartilha religiosa, gerando alienação ou deformação, mas antes, a teologia e a fé cristã possibilitam que o cristão seja inserido no caminho da vida, influenciando o mundo através da graça de Deus em Cristo Jesus. Porém, a referência de toda experiência e doutrinação da fé cristã se baseia nos escritos da bíblia. Sendo que, em todo momento existiu a necessidade da contextualização da mensagem bíblica no tempo e na história. Nunca foi um desafio para a Bíblia ser contemporânea, uma vez que, sua natureza é dinâmica e renovável no processo histórico da humanidade. O desafio sempre esteve presente na maneira com que os homens iriam manuseá-la, aplicando suas verdades. Uma reflexão importantíssima é de como a igreja contemporânea pode ter uma mensagem bíblica contextualizada para a sociedade pós-moderna? O que cada cristão pode fazer para que, o mundo compreenda a mensagem de Deus em Cristo Jesus? Qual o real significado e importância da bíblia para a geração contemporânea? Como identificar e praticar a doutrina bíblica em um tempo de extremo relativismo? A bíblia sempre foi alvo de atentados, fogueiras, e descrédito ao longo da história, no entanto nenhuma bigorna resistiu o confronto com a palavra de Deus. Passado o tempo da perseguição literal e concreta na idade média, que pretendia extirpar definitivamente as escrituras sagradas do alcance das pessoas, novas frentes de perseguição objetivam roubar o conteúdo bíblico. È claro que não existem mais as fogueiras, cruzadas e guerras santas em nosso tempo. A oposição às escrituras sagradas atualmente acontece por vias mais subjetivas e sutis, muitas vezes partindo de movimentos, e teológicas desenvolvidas internamente por alguns “cristãos”. Entre algumas oposições contemporâneas as escrituras sagradas, destacassem algumas: Teismo aberto – A teologia relacional ou teologia da abertura de Deus como também é conhecida o teísmo aberto não é uma teologia nova. Segundo o escritor e pastor Augustus Nicodemos – Ela tem raízes em conceitos antigos de filósofos gregos, no socinianismo (que negava exatamente que Deus conhecia o futuro, pois atos livres não podem ser preditos) e especialmente em ideologias modernas, como a teologia do processo. O que ela tem de novo é que virou um movimento teológico composto de escritores e teólogos que se uniram em torno dos pontos comuns e estão dispostos a persuadir a igreja cristã a abandonar seu conceito tradicional de Deus e a convencê-la que esta “nova” visão de Deus é evangélica e bíblica. No Brasil, o teísmo abeto é defendido por algumas lideranças bastante conhecidas no meio evangélico. Os principais pontos teológicos defendidos pelo teísmo aberto podem ser resumidos desta forma: (1) Deus não conhece plenamente o futuro, mas somente aquilo que pode ser sabido. (2) O livre arbítrio do homem depende estritamente da limitação do conhecimento de Deus no tempo. (3) O principal atributo divino é o amor, e isto, relativiza todos os demais atributos divinos. (4) Deus não é soberano, de modo que, pode ser surpreendido como no caso do terremoto no Haiti em 2010. (5) O futuro é determinado pela combinação de atitudes entre Deus e o homem. Entre as diversas oposições contra a teologia ortodoxa reformada, o teísmo aberto certamente é uma das principais, porque procura explicar o inexplicável, colocando Deus nos limites da razão humana. Seus adeptos preferem acreditar em um Deus que aprende e adquire conhecimento com o tempo, negando a soberania e a presciência divina. É verdade que a teologia tradicional adotada pelo cristianismo histórico não responde a todos os questionamentos sobre os planos de Deus, simplesmente porque estamos falando de Deus. Um “Deus” que caiba dentro dos questionamentos humanos torna-se um ídolo. O Deus revelado pelas escrituras sagradas, e fundamentado pela teologia histórica do cristianismo é soberano, pleno, onipotente, conhecedor do futuro e que se manifestou plenamente pela graça em Cristo Jesus.

Reformado ou Reformando: com o que nos parecemos?

Como cristãos reformados, frequentemente somos questionados por aqueles de fora da Fé Reformada: “O que significa ‘reformado’?”. Muitas respostas breves estão disponíveis, a maioria das quais enfatiza alguma relação com o movimento protestante europeu do século XVI e a sua teologia. Mas o que pensamos de nós mesmos quando pensamos na palavra “reformado”? Há uma tentação entre alguns de nós quanto a romantizar o período histórico da Reforma e pensar nele como o nosso ideal. Pode ser um problema para nós pensarmos no termo “reformado” como antigo e no tempo pretérito. Isso pode levar cristãos reformados do século XXI a uma visão de certa forma distorcida dos objetivos atuais da igreja.

Não devemos pensar na Reforma como simplesmente uma foto de alguma era dourada do cristianismo, que deve ser replicada pelos cristãos e igrejas do século XXI. Antes, devemos pensar na Reforma como sendo mais semelhante a um filme ainda em processo de ser filmado. Embora possamos honrar, admirar e concordar com muitos cristãos reformados que viveram nos últimos cinco séculos, nosso objetivo como cristãos reformados hoje não é uma mera duplicação do passado. Crescimento significa mudança, e a América do século XXI tem mudado consideravelmente em comparação aos séculos XVI e XVII na Europa. Os princípios e a teologia da Reforma Protestante têm permanecido relativamente constantes. Contudo, as questões dos nossos dias e a aplicação desses princípios e teologia mudaram em muitos aspectos.

Somente a Escritura permanece como a pedra angular da Reforma então e agora. Ela é “a única regra de fé e prática” para todos os homens, em todos os tempos e em todos os lugares. Todavia, as Escrituras são impressionantemente adaptativas no que concerne à aplicação dela a nós mesmos, nossas famílias, nossas igrejas e nossa cultura. A Bíblia nunca está fora de moda. Por exemplo, Efésios 5.25 nos instrui: ‘Maridos, amai vossas mulheres, como também Cristo amou a igreja, e a si mesmo se entregou por ela”. É provável que todo marido cristão tenha algumas formas únicas de demonstrar o seu amor à sua esposa que difiram daquelas de outros maridos cristãos. Contudo, todo marido cristão, aplicando e adaptando a Palavra de Deus para satisfazer as necessidades de sua esposa, pode cumprir as exigências bíblicas de amar a sua esposa. Além domais, o mesmo é verdadeiro no que concerne a outras áreas da vida e do ministério. Há multidões de maneiras através das quais podemos honrar e aplicar a Escritura imutável a um mundo sempre em mudança.

A própria natureza da reforma é que ela é um processo que nunca tem fim. Há duas razões óbvias para isso. Primeiro, como homens pecadores estamos frequentemente errados em nosso entendimento da Escritura e como ela deve ser aplicada. De fato, há somente um significado objetivo da Palavra de Deus, tendo sido transmitido infalivelmente a homens. Contudo, embora a transmissão da Bíblia seja clara, sua recepção por homens caídos, mesmo os redimidos, não é sempre tão clara. Como cristãos crescemos em nosso entendimento da verdade objetiva da Escritura e passamos a ver áreas de prática incorreta ou conduta pecaminosa. Como resultado, devemos continuamente reformar (i.e., conformar aos padrões escriturísticos). A menos que sejamos perfeitos em nosso entendimento e conduta, o processo de reforma nunca deve cessar, seja pessoal ou corporativamente.

Em segundo lugar, a Reforma é um processo que nunca tem fim porque o mundo ao redor de nós está em estado constante de mudança — somente Deus não muda. Em princípio “não há nada novo debaixo do sol”; todavia, na aplicação há novas ideias, práticas, tecnologias, questões e desafios que continuamente nos confrontam como cristãos. Podemos estar lutando as mesmas antigas batalhas, mas o inimigo está usando novas táticas e armas em seu ataque. Se não estivermos atentos a essas mudanças em nossa cultura, não podemos esperar contemplar uma vitória em nossos dias. Dentro dos limites das Escrituras, cristãos enquanto indivíduos e as igrejas devem continuamente reformar suas táticas e práticas sempre que necessário, a fim de enfrentar os desafios dos nossos dias. Não podemos voltar aos “bons velhos dias” — Deus os colocou no passado.

Contudo, Deus nos colocou no século XXI como soldados de Jesus Cristo para lutar as batalhas presentes com armas de ponta. Os Reformadores dos séculos anteriores usaram as armas de seus dias para alcançar a sua geração com o evangelho. Palestras, pregação, debates públicos, universidades e testemunhos pessoais eram todos os meios de comunicar-se verbalmente com o mundo deles. O uso da imprensa e da distribuição maciça de tratados, livros e Bíblias foram também meios eficazes de espalhar a Palavra. Grandes obras de arte surgiram, e até mesmo o cântico congregacional foi uma inovação da Reforma (Martinho Lutero escreveu hinos usando a música folclórica popular do seu tempo). Os cristãos estavam com frequência na vanguarda do uso de novas ideias e tecnologias.

Da mesma forma, devemos fazer uso desses métodos de comunicar o evangelho que os nossos irmãos nos legaram. Além do mais, devemos também fazer uso dos novos métodos que estão disponíveis a nós. Temos áudio, vídeo, rádio, televisão, computadores, internet e transporte rápido. Deveríamos encorajar o uso desses meios juntamente com o desenvolvimento de novas ideias e tecnologias. Como cristãos reformados deveríamos estar liderando o caminho no desenvolvimento de arte e música bíblicas que permeiem a nossa cultura com o sal e a luz do evangelho.

O perigo de uma reforma estagnada é real. Mesmo em igrejas reformadas podemos ser tentados a dizer: “Até aqui e não mais”. A Igreja da Inglaterra fornece um exemplo vívido desse conservadorismo antibíblico e sufocante. Quando paramos de reformar paramos de viver e começamos a morrer. A vida é um processo de constante mudança chamado crescimento ou maturidade, e reforma é vida porque ela nunca cessa de aplicar a Palavra viva a todo o mundo ao redor de nós.

Certamente devemos ser cautelosos à medida que avançamos. Não queremos mudar simplesmente para estar mudando. É possível mudar de algo bom para algo ruim, ou de algo ruim para algo pior ainda. Toda ideia deve ser testada pela Escritura somente. Contudo, nem a preferência pessoal nem a tradição deveriam ficar no caminho da reforma bíblica. O medo de “ao que isso poderia levar” (a “falácia da ladeira escorregadia”), ou o fato que outros poderiam abusar da boa ideia muitas vezes nos impedem de avançar com a reforma e satisfazer as necessidades e desafios dos nossos dias. Todavia, se a Escritura permanece firmemente como nosso perímetro, então podemos avançar com segurança, conhecendo as limitações da nossa mudança. Devemos avaliar os riscos, tomar as precauções devidas para assegurar a aderência à Palavra de Deus, e então avançar com expectativa confiante das bênçãos de Deus. Caso contrário, permaneceremos presos em casa, com medo do futuro.

Se a reforma há de continuar (i.e., viver) em nossos dias, então devemos permanecer sobre os ombros das gerações de reformadores que vieram antes de nós e chegar mais alto. Nossa geração deve ser mais do que tropas ocupacionais. Devemos ser isso, mas deveríamos ser muito mais — ainda há praias a serem invadidas — a guerra não terminou. As gerações que nos seguem enfrentarão novos desafios à sua fé e novas batalhas a serem travadas. Devemos levantá-los e apoiá-los, fornecendo um firme fundamento sobre o qual eles possam construir. Nossa tarefa não é subjugá-los, mas dirigi-los e incentivá-los. As implicações da Fé Reformada para o mundo de amanhã não podem ser vistas por nós. Nosso mundo muda a uma velocidade ofuscante. A próxima geração de reformadores não é uma ameaça para nós, mas deveria ser uma ameaça para o mundo de amanhã.

A soberania de Deus na salvação

Como pode um homem sendo pecador ser salvo? Como pode um injusto ser declarado justo aos olhos do Deus santo? Como pode o homem tão vulnerável ter garantia de salvação? Paulo responde a essas questões quando escreve sua carta aos romanos. Vamos, tratar aqui de cinco afirmações categóricas que nos afirmam a soberania de Deus na salvação. Em primeiro lugar, Deus nos conheceu desde a eternidade (Rm 8.29). Deus nos conheceu de antemão. Ele nos amou desde toda a eternidade. Amou-nos não porque viu algo em nós que despertasse seu amor, mas amou-nos incondicionalmente. Antes do sol brilhar no horizonte, Deus já havia colocado em nós seu coração. Antes dos mundos estalares virem à existência, nós já estávamos no coração de Deus. Seu amor por nós é eterno, incomensurável e incondicional. Em segundo lugar, Deus nos predestinou para a salvação (Rm 8.30). Deus nos predestinou em Cristo, para a salvação, antes da fundação do mundo, desde o princípio, pela santificação do Espírito e fé na verdade, a fim de sermos santos e irrepreensíveis perante ele. Deus não nos escolheu porque previu que iríamos crer em Cristo; cremos em Cristo porque ele nos escolheu. A escolha divina é a causa da fé e não sua consequência. Deus não nos escolheu porque viu em nós santidade; fomos eleitos para sermos santos e irrepreensíveis e não porque éramos santos e irrepreensíveis. A santidade não é a causa da eleição, mas seu resultado. Deus não nos escolheu porque viu em nós boas obras; somos feitura dele, criados em Cristo Jesus, para as boas obras, e não porque praticávamos boas obras. As boas obras são fruto da escolha divina e não sua raiz. Em terceiro lugar, Deus nos chamou eficazmente (Rm 8.30). Todos aqueles que são escolhidos por Deus na eternidade, por quem Cristo morreu no calvário, são chamados à salvação, e chamados eficazmente. O homem pode até resistir temporariamente a esse chamado, mas não finalmente. Jesus disse que ninguém pode vir a ele se o Pai não o trouxer. Disse, também, que suas ovelhas ouvem sua voz e o seguem. Os que Deus predestina, Deus chama. Há dois tipos de chamados: um externo e outro interno; um dirigido aos ouvidos e outro ao coração. Aqueles que são predestinados, ao ouvirem a voz do bom pastor, atendem-na e o seguem. Em quarto lugar, Deus nos justificou por sua graça (Rm 8.30). Aqueles que são amados, escolhidos e chamados são também justificados. A justificação é uma obra de Deus por nós e não em nós; é um ato e não um processo. É uma declaração forense feita diante do tribunal de Deus e não uma infusão da graça. É completa e irrepetível. Por isso, não possui graus. O menor crente está tão justificado quanto o indivíduo mais piedoso. Pela obra substitutiva e vicária de Cristo na cruz somos declarados quites com as demandas da lei de Deus. Não pesa sobre nós mais nenhuma condenação. Nossos pecados passados, presentes e futuros já foram julgados na pessoa de Cristo, nosso substituto e fiador. Nossos pecados foram colocados na conta de Cristo e a justiça de Cristo foi colocada em nossa conta. Estamos quites com todas as demandas da justiça divina. Em quinto lugar, Deus nos glorificou pelo seu poder (Rm 8.30). Embora a glorificação seja um fato futuro, que se dará na segunda vinda de Cristo, na mente e nos decretos de Deus já é um fato consumado. Mesmo que o caminho seja estreito e juncado de espinhos. Mesmo que os inimigos nos espreitem e toda a fúria de Satanás seja despejada contra nós, nada nem ninguém, neste mundo ou mesmo no porvir poderá nos separar do amor de Deus que está em Cristo Jesus nosso Senhor. Nossa salvação foi planejada, executada, aplicada e assegurada por Deus. A Deus, portanto, a glória, agora e sempre por tão grande salvação!