Por Albert Mohler Jr.
Cristãos evangélicos tem
estado especialmente atentos à questão da adoração nos anos recentes,
reacendendo pensamentos e conversas a respeito do que realmente é
adoração e como deve ser feita. Mesmo que esse interesse renovado tenha,
infelizmente, resultado em muitos conflitos em algumas igrejas, é
possível que aquilo que A. W. Tozer uma vez chamou de “a joia perdida”
da adoração evangélica está sendo recuperada.
Entretanto, se a maioria
dos evangélicos rapidamente concorda que a adoração é o centro da vida
da igreja, não consenso para responder uma questão inescapável: o que é
central na adoração cristã? Historicamente, igrejas mais litúrgicas
afirmam que os sacramentos formam o cerne da adoração cristã. Essas
igrejas argumentam que os elementos da Ceia do Senhor e a água do
batismo são a forma mais poderosa de apresentar o evangelho. Entre os
evangelicais, alguns apontam para o evangelismo como o cerne da
adoração, planejando cada faceta do culto – músicas, orações, o sermão –
com o apelo evangelístico em mente.
Por mais que muitos
evangélicos mencionem a pregação da palavra como necessária ou parte
comum da adoração, o modelo de adoração que prevalece nas igrejas
evangélicas é, cada vez mais, definido pela música, juntamente com
inovações como apresentações teatrais e audiovisuais. Quando a pregação
da palavra recua, um sem número de inovações de entretenimento tomam seu
lugar.
Normas tradicionais de
adoração agora estão subordinadas à uma demanda por relevância e
criatividade. Uma cultura visual orientada à mídia substituiu a cultura
orientada à palavra que serviu de berço para as igrejas reformadas. De
certa forma, a cultura orientada à imagens do evangelicalismo moderno é
uma aceitação das mesmas práticas que foram rejeitadas pelos
reformadores em sua busca por uma adoração verdadeiramente bíblica.
A música preenche a
maior parte do espaço na adoração evangélica, e muito dessa música vem
na forma de corinhos contemporâneos marcados por pouquíssimo conteúdo
teológico. E além da popularidade do corinho como forma musical, muitas
igrejas evangélicas parecem intensamente preocupadas em replicar a
qualidade dos estúdios em suas apresentações musicais.
Em termos de estilo
musical, as igrejas mais tradicionais apresentam grandes corais – muitas
vezes com orquestras – e podem até cantar os hinos mais estabelecidos
da fé. A contribuição dos corais é muitas vezes massiva em sua escala e
profissional em sua qualidade. Em qualquer evento, a música preenche o
espaço e conduz a energia do culto de adoração. Planejamento intenso,
investimento financeiro e preparação prioritária são direcionados para a
dimensão musical da adoração. Equipes profissionais e um exército de
voluntários gastam muito de suas semanas em ensaios e práticas de grupo.
Tudo isso não passa
despercebido à congregação. Alguns cristãos consumem igrejas que
oferecem o estilo de adoração e experiências que se encaixa em suas
expectativas. Em muitas comunidades, as igrejas são conhecidas por seu
estilo de adoração e seus eventos musicais. Aqueles insatisfeitos com o
que encontram em uma igreja podem rapidamente se mudar para outra, às
vezes usando a linguagem da auto-expressão para explicar que a nova
igreja “atente nossas necessidades” ou “nos permite adorar com
liberdade”.
Uma preocupação com
adoração verdadeiramente bíblica estava no cerne da Reforma. Mas mesmo
Martinho Lutero, que compôs hinos e considerava obrigatório que os
pregadores fossem musicalmente treinados, não reconheceria essa
preocupação moderna com música como legítima ou saudável. Por quê?
Porque os reformadores estavam convencidos que o centro da verdadeira
adoração bíblica era a pregação da palavra de Deus.
Graças a Deus pelo
evangelismo ser parte da adoração cristã. Confrontados pela apresentação
do evangelho e pela pregação da palavra, pecadores são atraídos à fé em
Jesus Cristo e a oferta da salvação é apresentada a todos. De forma
semelhante, a Ceia do Senhor e o batismo são honrados enquanto
ordenanças dos mandamentos do Senhor, e ambos tem seu lugar na
verdadeira adoração.
Além disso, a música é
um dos mais preciosos dons de Deus para seu povo, e é uma linguagem pela
qual podemos adorar Deus em espírito e em verdade. Os hinos da fé
trazem riqueza confessional e conteúdo teológico, e muitas canções
modernas recuperam um senso de doxologia outrora perdido em muitas
igrejas evangélicas. Mas a música não é o ato central da adoração
cristã, nem o evangelismo e nem mesmo os sacramentos. O cerne da
adoração cristã é a pregação autêntica da palavra de Deus.
Pregação expositiva é
central, irredutível e inegociável para a missão bíblica de adoração
autêntica que agrada a Deus. A simples declaração de John Stott afirma a
questão de forma ousada: “Pregação é indispensável ao Cristianismo”.
Mais especificamente, a pregação é indispensável à adoração cristã – e
não apenas indispensável, mas central.
A centralidade da
pregação é o tema de ambos os testamentos da Escritura. Em Neemias 8,
vemos o povo exigindo que Esdras, o escriba, traga o livro da lei à
assembleia. Esdras e seus pares se colocaram em uma plataforma elevada e
leram do livro. Quando ele abria o livro para ler, a assembleia se
colocava de pé em honra a palavra de Deus e respondia “Amém, amém!”.
De forma interessante, o
texto explica que Esdras que aqueles que o auxiliavam “leram no livro,
na Lei de Deus, claramente, dando explicações, de maneira que
entendessem o que se lia” (Neemias 8.8). Esse texto notável apresenta um
retrato da pregação expositiva. Uma vez que o texto era lido, ele era
cuidadosamente explicado para a congregação. Esdras não promoveu uma
apresentação ou orquestrou um espetáculo – ele simples e cuidadosamente
proclamou a palavra de Deus.
Esse texto é uma séria
acusação contra grande parte do cristianismo contemporâneo. De acordo
com esse texto, a demanda pela pregação bíblica emergiu dos corações do
povo. Eles se reuniram como uma congregação e invocaram o pregador. Isso
reflete uma intensa fome e sede da pregação da palavra de Deus. Onde
está evidente esse desejo em meio aos evangélicos de hoje?
A Bíblia está quase
calada em igrejas além da conta. A leitura pública da Escritura foi
abandonada em muitos cultos, e o sermão tem sido ofuscado, reduzido a
uma breve devocional ao fim da música. Muitos pregadores aceitam isso
como uma concessão necessária à era do entretenimento. Alguns conseguem
inserir uma breve mensagem de encorajamento ou exortação antes da
conclusão do culto.
Como Michael Green colocou, “essa é a era do sermãozinho, e sermãozinhos geram cristãozinhos”.
A anemia da adoração
evangélica – à parte de toda a música e energia – é diretamente
atribuível à ausência da pregação expositiva genuína. Tal pregação
deveria confrontar a congregação com nada menos que a viva e ativa
palavra de Deus. E essa confrontação vai moldar a congregação, conforme o
Espírito Santo acompanha a palavra, abre os olhos e aplica essa palavra
aos corações humanos.