segunda-feira, 28 de abril de 2014

Moralismo não é o evangelho



Por Albert Mohler Jr

…mas muitos pensam que é

Uma das afirmações mais espantosas do apóstolo Paulo é sua acusação aos gálatas por terem abandonado o evangelho: “Admira-me que estejais passando tão depressa daquele que vos chamou na graça de Cristo para outro evangelho”. Como foi afirmado tão enfaticamente, os gálatas haviam falhado no teste crucial de discernir o evangelho autêntico de suas imitações.

Suas palavras não poderiam ser mais claras: “Mas, ainda que nós ou mesmo um anjo vindo do céu vos pregue evangelho que vá além do que vos temos pregado, seja anátema. Assim, como já dissemos, e agora repito, se alguém vos prega evangelho que vá além daquele que recebestes, seja anátema.” (Gálatas 1.8-9)

Esse alerta do apóstolo Paulo, expressado por meio de choque e pesar, é direcionado não apenas à igreja na Galácia, mas a toda congregação de qualquer era. Em nossos dias – e em nossas igrejas – precisamos desesperadamente ouvir e atentar a esse alerta. Em nossos dias, enfrentamos falsos evangelhos não menos subversivos e sedutores que aqueles encontrados e abraçados pelos gálatas.

Em nosso contexto, um dos falsos evangelhos mais sedutores é o moralismo. Esse falso evangelho pode tomar muitas formas e pode emergir de vários impulsos culturais e políticos. Ainda assim, a estrutura básica do moralismo se resume a isso – a crença de que o Evangelho pode ser resumido à melhorias de comportamento.

Infelizmente, esse falso evangelho é particularmente atrativo àqueles que acreditam serem evangélicos motivados por impulsos bíblicos. Crentes além da conta, e suas igrejas, sucumbem à logica do moralismo e reduzem o Evangelho à mensagem do desenvolvimento moral. Em outras palavras, nós comunicamos aos perdidos a mensagem de que o que Deus deseja para eles e requer deles é que eles vivam suas vidas corretamente, na linha.

Em certo sentido, nós nascemos para sermos moralistas. Criados à imagem de Deus, nos foi dada a capacidade moral da consciência. Desde nossos primeiros dias, nossa consciência já manifesta nosso conhecimento de culpa, de falhas e de maus comportamentos. Em outras palavras, nossa consciência acusa nossa pecaminosidade.

Adicione a isso o fato de que o processo de educação infantil tende a inculcar o moralismo desde cedo. Nós rapidamente aprendemos que nossos pais estão preocupados com nosso comportamento. Crianças bem comportadas são recompensadas com a aprovação dos pais, enquanto a malcriação traz seus castigos. Essa mensagem é reforçada por outras autoridades sobre os mais novos e permeia toda a cultura em geral.

Escrevendo sobre sua própria infância no interior rural da Georgia, o romancista Ferrol Sams descreveu a tradição enraizada de ser “bem educado”. Conforme ele explicou, a criança “bem educada” agrada seus pais e outros adultos ao aderirem a certas convenções morais e à etiqueta social. Um jovem “bem educado” se torna um adulto que obedece a lei, respeita seu próximo, se compromete, pelo menos verbalmente, às expectativas religiosas e se mantém longe do escândalo. O argumento é claro – isso é o que os pais esperam, a cultura afirma e muitas igrejas celebram. Mas nossas comunidades estão cheias de pessoas “bem educadas” que estão destinadas ao inferno.

A sedução do moralismo é a essência de seu poder. Somos facilmente levados a acreditar que realmente podemos conquistar toda a aprovação que precisamos por meio de nosso comportamento. É claro, para fazer parte dessa sedução, precisamos negociar um código moral que define o comportamento aceitável com inúmeras brechas. A maioria dos moralistas não diria que não tem pecado, mas sim que estão longe do escândalo. Isso é considerado suficiente.

Moralistas podem ser categorizados tanto como liberais quanto como conservadores. Em cada caso, um conjunto específico de obrigações morais constrói a expectativa moral. Generalizando, normalmente é verdade que os liberais focam em um conjunto de expectativas morais relacionadas à ética social, enquanto os conservadores tendem a focar na ética pessoal. A essência do moralismo é aparente em ambos – a crença de que podemos alcançar justiça por meio de bom comportamento.

A tentação teológica do moralismo é tal que muitos cristãos e igrejas tem dificuldade de resistir. O perigo é de que a igreja comunique tanto direta quanto indiretamente que o que Deus espera da humanidade caída é desenvolvimento moral. Ao fazê-lo, a igreja subverte o Evangelho e comunica um falso evangelho para o mundo caído.

A igreja de Cristo não tem outra opção além de pregar a Palavra de Deus, e a Bíblia revela fielmente a lei de Deus e um código moral abrangente. Os cristãos entendem que Deus revelou a si mesmo por meio da criação de tal forma que deu à humanidade o poder restritivo da lei. Mais ainda, ele nos comunicou por meio de sua palavra mandamentos específicos e instruções morais abrangentes. A igreja do Senhor Jesus Cristo que é fiel precisa batalhar pela retidão desses mandamentos e a graça que nos foi dada de conhecer o que é bom e o que é mau. Também temos a responsabilidade de testemunhar esse conhecido do bem e do mal aos nossos próximos. O poder restritivo da lei é essencial à comunidade e à civilização humana.

Assim como pais corretamente ensinam seus filhos a obedecerem instruções morais, a igreja tem a responsabilidade de ensinar aos seus os mandamentos morais de Deus e de testemunhar à sociedade ao redor o que Deus declarou ser justo e correto para suas criaturas humanas.

Mas esses impulsos, por mais corretos e necessários que sejam, não são o Evangelho. De fato, um dos evangelhos falsos mais insidiosos é o moralismo que promete o favor de Deus e a satisfação de sua justiça aos pecadores se eles simplesmente se comportarem bem e se comprometerem com a melhoria moral.

O impulso moralista na igreja reduz a Bíblia a um livro de regras para o comportamento humano e substitui o Evangelho de Jesus cristo por instrução moral. Púlpitos evangélicos além da conta são a fonte de mensagens moralistas, ao invés da pregação do Evangelho.

O corretivo para o moralismo vem diretamente do apóstolo Paulo quando ele insiste que “o homem não é justificado por obras da lei, e sim mediante a fé em Cristo Jesus”. A salvação vem para aqueles que são “justificados pela fé em Cristo e não por obras da lei, pois, por obras da lei, ninguém será justificado” (Gálatas 2.16).

Nós pecamos contra Cristo e distorcemos o Evangelho quando sugerimos aos pecadores que o que Deus demanda deles é o desenvolvimento moral de acordo com a Leu. O moralismo faz sentido para pecadores, pois é uma expansão daquilo que aprendemos desde nossos primeiros passos. Mas o moralismo não é o Evangelho, e ele não salva. O único evangelho que salva é o Evangelho de Cristo. Como Paulo lembrou os gálatas, “vindo, porém, a plenitude do tempo, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a lei, para resgatar os que estavam sob a lei, a fim de que recebêssemos a adoção de filhos.” (Gálatas 4.4-5)

Nós somos justificados somente pela fé, salvos somente pela graça e redimidos de nossos pecadossomente por Cristo. O moralismo produz pecadores que são mais bem comportados (em potencial). O Evangelho de Cristo transforma pecadores em filhos adotivos de Deus.

A igreja nunca deve desviar, acomodar, revisar ou esconder a lei de Deus. De fato, é a lei que nos mostra nosso pecado e deixa clara a nossa inadequação e nossa total falta de justiça. A Lei não pode dar vida mas, como Paulo insiste, “nos serviu de aio para nos conduzir a Cristo, a fim de que fôssemos justificados por fé.” (Gálatas 3.24).

O perigo mortal do moralismo tem sido uma tentação constante à igreja e um substituto muito conveniente para o Evangelho. Claramente, milhões de nossos próximos creem que o moralismo é a nossa mensagem. Nada menos que a pregação audaciosa do Evangelho será o suficiente para corrigir essa impressão e levar pecadores à salvação em Cristo.

O inferno será amplamente povoado por aqueles “bem educados”. Os cidadãos do céu serão aqueles que, pela pura graça e misericórdia de Deus, estarão lá apenas pela justiça imputada de Jesus Cristo.

O CRISTIANISMO NÃO É MORAL, MAS ONTOLÓGICO!

Por Fabio Campos
Texto base: “A isto, respondeu Jesus: Em verdade, em verdade te digo que, se alguém não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus”. – João 3.3 ARA

Alguém já disse que “a diferença entre Deus e o homem não é moral, mas ontológica, pois pecado não é o que faço, mas o que eu sou”. Quando estudamos a história da igreja percebemos o quanto, aos poucos, a eclésia foi dando mais ênfase na “tradição elaborada por homens”, através de um rigor ascético, do que propriamente no ensino dos Profetas e Apóstolo, os quais trataram a conversão com base no “novo nascimento” e do “novo coração”.

Impor compulsoriamente as regras morais foi um artifício muito usado no decorrer dos séculos. Longas listas do que “pode” ou “não pode”; purificação através de ritos; purgação de pecados através da negação dos prazeres legítimos; tudo era utilizado para avaliar quem de fato era salvo ou não. A teologia cristã foi rarefeita por diversas vezes por conta disso. Alguns ensinos tinham por objetivo coagir as pessoas a não pecarem. Esta era a forma utilizada pela liderança eclesiástica para refrear os impulsos pecaminosos. Com isso muitos foram se distanciando do ensino escriturístico do “novo nascimento”, enveredando-se para os “preceitos e doutrinas de homens”. Como bem disse o Apóstolo: “Tais coisas, com efeito, têm aparência de sabedoria, como culto de si mesmo, e de falsa humildade, e de rigor ascético; todavia, não têm valor nenhum contra a sensualidade” (Cl 2.23 ARA). Infelizmente muitas denominações têm afastado as pessoas por conta dos “usos e costumes” a qual erradamente se referem por “doutrina”.

Quando analisamos o Ensino bíblico [a verdadeira e única Doutrina] a respeito do pecado e da salvação pela graça em Jesus Cristo, não é difícil de entender que Deus se compraz “em um coração contrito e quebrantando” ao invés de “sacrifícios feitos pelas mãos dos homens” (Sl 51.16-17). Muito mais importante do que sacrificar é obedecer, pois não é o exterior quem contamina o homem. É do coração que procede todo tipo de pecado. Somente um novo coração pode obedecer, pois a carne não está sujeita a lei de Deus, nem mesmo pode estar (Rm 8.7). O cristianismo não se trata de um sistema moral, mas de um novo nascimento. Não é aquilo que é ou deixa de ser lícito; mas do que convém. Não é algo tangível a ensinar: “não toque nisso”; “não proves aquilo”; “não toques aquiloutro”. Transcende isto tudo! O Reino é Paz e Alegria no Espírito Santo.

Mesmo correndo grandes riscos prefiro não usar da persuasão humana na pregação para coagir pessoas no que devem ou não fazer. Apenas exponho a Palavra e deixo a tarefa de convencer para o Espírito Santo. A pregação não é a exposição moral do que pode ou não pode. A pregação é luz nas trevas, simples e exclusivamente para conduzir o homem a examinar-se a si mesmo, e descobrir pelo crivo da Verdade, as intenções reais do seu coração enganoso e perverso. Não vai adiantar abrigar “vinho novo” em “odres velhos”. Ambos se perderão. O vinho novo precisa ser posto em odres novos. O Cristianismo é a mudança daquilo em que você se alegra. Posso me alegrar no meu moralismo e estar na condição de hipócrita - honrando a Deus apenas com os lábios - mas com um coração longe dEle. 

Nossa ministração será mais eficaz no dia que ousarmos abrir mão de ensinos morais tentando guiar as pessoas através de cabrestos. A verdadeira conversão passa pelo teste da liberdade. Tenho a oportunidade de fazer algo, mas conheci algo muito melhor e que traz mais satisfação ao meu coração: a saber, “a comunhão com Deus”. A confissão de todo Cristão genuíno: “Para onde iremos nós se só Tu tens palavras de vida eterna”. O contrário também é verdade com o sujeito que ainda nasceu de novo. Ele se reprime e não peca a princípio por temor aos homens e para cumprir o check-list de “santarrão”. Certamente, hora menos horas, a carne vai ceder!, e a demanda reprimida de pecados que havia naquele coração tornará seu estado muito pior do que o primeiro.

Ser bom moralmente para o cristão não é algo que exige esforço. É como os ramos de uma árvore; produz os frutos sem perceber. Todavia, é a raiz que sustenta os ramos. A figueira não pode produzir azeitonas e a videira produzir figos. Um “cristão” mau-caráter não é um cristão. Somos salvos pela graça, mediante a fé. A fé se evidencia pelas obras. Logo pelos frutos seremos conhecidos.

Não escaparemos do que disse Jesus: “se alguém não nascer de novo, não pode ver o Reino de Deus”. Os “usos e costumes” e a santidade que teve o crivo elaborado pela tradição humana é válida para o julgamento dos homens, mas diante de Deus, é “trapo de imundícia”. Pois o Senhor não vê como o homem vê. O homem analisa o exterior; o Senhor prova o coração. O reino de Deus não abriga gente de boa conduta, mas apenas aqueles que nasceram da água e do Espírito através de Jesus Cristo. Como bem disse John Wesley:

“Uma pessoa pode ir à igreja duas vezes por dia, participar da ceia do Senhor, orar em particular o máximo que puder, assistir a todos os cultos e ouvir muitos sermões, ler todos os livros que existem sobre Cristo. Mas ainda assim tem que nascer de novo”.

Soli Deo Gloria!